“A convicção de ser autossuficiente e de conseguir eliminar o mal presente na história apenas com a própria ação induziu o homem a identificar a felicidade e a salvação com formas imanentes de bem-estar material e de ação social. Depois, a convicção da exigência de autonomia para a economia, que não deve aceitar influências de caráter moral, impeliu o homem a abusar dos instrumentos econômicos até mesmo de forma destrutiva” (cf. caritas in veritate, n. 34). Eis os dois grandes desafios da ética cristã na relação com o poder econômico vigente. A Campanha da Fraternidade 2010 vem justamente denunciar e ser forma simbólica para a sociedade na tomada de consciência dos idolatras do capitalismo selvagem que destroem a Vida para acumular dinheiro e poder. Afirma Mateus: “Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (cf. Mt 6,24).
A ética cristã para razão dos bens está contida no testemunho das pequenas comunidades (cf. At 2,42-47; 4,32-37). A idéia era que a comunidade deveria ter tudo em comum. Esta dinâmica, sem dúvida, não deixa ser enriquecida com a mística e o testemunho da ressurreição que animava os neoconvertidos para que vissem na conversão no tempo presente a plenitude da vida futura. Já nos evangelhos de Mateus e Lucas está presente uma complementação de que a pobreza interior (cf. Mt 5,3) e da pobreza exterior (cf. Lc 6,20). A promessa é que estes terão a felicidade eterna. Esta mesma ética terá sempre como base indissolúvel e fonte perene a gratuidade de Deus amor. O princípio hermenêutico e prático da ação cristã no mundo é certeza de que quem é filho revela o que é próprio do Pai (cf. Jo 5,19-47).
A CF 2010 assinala que na lógica do mercado, paga-se pela troca de bens e serviços. Entretanto, existem exigências humanas importantes, coletivas e qualitativas, que não podem ser satisfeitas através desse mecanismo. Há valores que, devido à sua natureza, não se podem nem se devem vender e comprar (cf Texto base, n. 22). Justamente neste ponto é que acrescenta a doutrina social cristã, quando reflete que “sem formas internas de solidariedade e de confiança recíproca, o mercado não pode cumprir plenamente a própria função econômica. E, hoje, é precisamente esta confiança que vem a faltar; e a perda da ‘confiança’ é uma perda grave” (cf. Caritas in veritate, n. 35).
Segundo o Santo Padre, “a atividade econômica não pode resolver todos os problemas sociais pela simples extensão da lógica mercantil. Esta deve ter como finalidade a prossecução do bem comum, do qual se deve ocupar também e, sobretudo, a comunidade política” (Idem, 36). Eis uma questão que no pensamento ético cristão, na modernidade, será idiossincrático: “O Estado não será dispensado da redistribuição dos bens, como razão de ser da sua própria instituição e locomoção. Ele será o mediador e regulador da ordem econômica. O mercado quando dispensa estas leis estatais terá dificuldades internas a longo prazo e desequilibrará as veias especulativas do seu funcionamento, que dispensam a necessidade dos bens fungíveis como meta econômica do ordenamento social.
A proposição da ética cristã no capitalismo não pode ser fundada numa vontade do indivíduo. Não haveria uma contradição teleológica ou finalista desta tendência “original e originante” do pecado primitivo? Na Posmodernidade pode ser motivo de orgulho para alguns, o fato de que existam bilhões de seres humanos, que são imagem e semelhança de Deus, na situação de pobreza e à margem das reais condições de dignidade humana? Portemos ao mundo o testemunho duma economia solidária que promova a vida! Assim o seja!