São José de Mipibú - RN / Arquidiocese Natal

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Relações humanas e Carnatal

Muitos potiguares e, até, várias personalidades midiáticas, se preparam para participar do Carnatal. Aqui, em Natal, nas Universidades, pelos Meios de Comunicação, em outros tantos ambientes sociais se fala sobre o evento. Este, por sua vez, toma conta, direta ou indiretamente, neste período, de muitos dos vários tipos de conversas das crianças, jovens, casais, comerciantes, patrocinadores, traficantes, o Poder Público e, enfim, a grande massa. Principalmente pelo marketing que tendencialmente é feito, tendo em vista a maior e mais profícua obtenção de lucro por parte daqueles que querem obter vantagens piramidais. Aqui se sobrepõe a lógica do mercado. Não se pode deixar de fazer esta breve acentuação sobre o que de fato é o fim deste dantesco e eletrizante modo de relacionar-se neste período do ano em Natal.

O Carnatal mostra, por assim dizer, como as pessoas estão se relacionando hoje. As pessoas estão sendo massificadas pelas leis do mercado e das grandes indústrias da festa. Na fala duma grande maioria de jovens, não todos (ainda bem!), se sente que as pessoas se tornaram marionetes nas mãos de quem detém o dinheiro e a mídia. Quando se ouve participantes (a grande maioria pensa e é induzida a pensar assim) dizer que “no Carnatal ninguém é de ninguém”, infere-se pela observação do cenário no qual acontece o evento que lá muitos dos videntes que previram o que poderia vir a ser a Humanidade indiferente ao transcendente e que, por isso sim, se configuraria o nihilismo, a neurose coletiva, a alienação, o nada etc. Os psicólogos, sociólogos e outros estudiosos de áreas afins podem fazer e aprender muito sobre os tipos de relações que perfazem a trajetória do modo de comunicar-se das pessoas de hoje analisando festividades como o Carnatal, Carnaval e outros circos des-culturalizados da modernidade. A cultura é fruto da ação do homem na História e por meio dela ele espiritualiza o que por ele é criado e transformado. Quando este é manipulado pelos Meios que formam o “inconsciente coletivo” ele deixa de ser e fazer cultura. A cultura da coisificação humana fará com que a própria Civilização entre em colapso.

Muitas são as conseqüências contrárias a Dignidade Humana que vem do Carnatal. A Pessoa Humana é infinitamente mais importante do que uma “Festa dos Macacos” (onde se pula sem saber o por que? se sobrepõem o instinto sobre a razão). Ninguém, por favor, venha dizer que tem haver com lúdico; pois, este não dispensa a harmonia e a beleza das expressões humanas. Ao contrário, é condição sem a qual seria encantador e prazeroso quando se tem em vista o divertimento.

Por fim, aos muitos participantes do momento a verdadeira curtição só se realiza em plenitude quando se ama de verdade. Quem experimentar esta Festa vai saber o que é a maior e mais digna de todas as relações humanas. Que assim o seja!

domingo, 23 de setembro de 2007

Sim, por uma questão de saúde!

Com a visita do Papa, que, chegando ao Brasil já enfatizou que a Igreja defende a vida desde a sua concepção, é retomada a discussão sobre a legalização do aborto e outros temas morais, como: o uso de contraceptivos, a camisinha, a união civil de homossexuais etc.

Visto imediatamente o modo como facções da Sociedade e, infelizmente, personalidades políticas que chegam a dizer que a legalização do aborto é uma questão de saúde pública (como se matar um inocente o fosse!), sob o pretexto de que é um tema defendido pela Igreja como questão dogmática e de que é preceito moral obsoleto; quando, na realidade, se trata de sólida preocupação cristã, mais ainda humana, e um modo de se tratar a dignidade da Pessoa que já está tipificado no próprio ordenamento jurídico do País (CF Art.1º,III).

É a própria Constituição, que no seu Art.5º afirma: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade”. Determinadas declinações feitas por políticos portadores de algum tipo de acefalia constitucional e filoantropológica (aqui a referência é mesmo à Lei Magna) é digna de revolta diante de observações que demonstram que não há preocupação de tornar reais as formulações constituídas e constitutivas do Estado e pelo Estado, através dos representantes do povo e para o povo. Numa perspectiva personalista, tais formulações constituem a meta de toda política pública realizada em vista do bem comum.

O que é sensível é que este mesmo Estado, flagelado pela corrupção, não está mantendo, através das suas Instituições o que lhe é de dever e, por isso, equivocada e demagogicamente busca, por vias imediatas e paliativas, o sufrágio de problemas imediatos sem considerar os fundamentais. Com isto não se esquecem as mulheres vítimas de atrocidades sociais; mas, ao contrário, é restituído a cada uma a plena dignidade que lhes deve ser garantida pela observância de todos os seus direitos legais (CF, Art.198º; ECA, Art.8º).

Para uma fundamentação contundente, é importante a objetiva impostação do Código Civil que, no Artigo 2º, normatiza: “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. Falar em personalidade no ordenamento jurídico é por ilação que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil (CC, Art.1º), contudo a ressalva que é feita quanto aos direitos do nascituro, desde a concepção, garante-lhe uma primazia absoluta que, por ser já naturalmente reconhecida, deve ser juridicamente inviolada. O próprio esquema posto desde a Constituição, passa pelo Código Civil, até chegar ao Estatuto da Criança e do Adolescente, que especificamente no artigo 7º postula quais são os direitos fundamentais daquele que nasce com vida e ordena que: “a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.”

Enfim o que é subjacente a estas poucas observações é que a Igreja está muito mais sintonizada com o que seja Saúde Pública do que muita gente que está por aí fazendo o que não deveria fazer; dizendo o que não deveria dizer; estando onde não deveria estar. A Igreja que, de fato e de direito, se sacrifica pela dignidade da Pessoa, continua sendo a favor da vida desde sua concepção até o seu ocaso natural, e vai, com autoridade, sempre convocar todos os discípulos e missionários de Jesus Cristo para que o sejam e para que n’Ele nossos povos tenham vida.

domingo, 16 de setembro de 2007

A Bíblia é a Palavra de Deus

Em setembro, a Igreja celebra o Mês da Bíblia. Para os crentes, ou seja, para todos os que têm fé em Deus, nela está contida a história da salvação. Esta aparece como acontecimento interativo entre a ação amorosa de Deus que é Amor (cf. 1Jo 4,8) e a liberdade humana que, como ato da vontade, veícula o conhecimento e plenitude da própria vida. Esta forma de personalização da realidade divina é elementar para o próprio discernimento interpretativo do que seja essa vida de Deus, que acontece no tempo e no espaço da comunidade fiel que acolhe a sua fala como palavras de vida segura, comunicativa, justa, fiel, alegre (cf. Dt 4,13-14; Sl 119). Já no Antigo Testamento são encontradas palavras, normas, estatuto, orientações (decálogo: dez palavras; Torah: instrução) dadas por Deus como meio vinculante de relação entre os homens e destes com Deus, tendo em vista uma crescente conscientização da aliança feita (cf. Gn 15,1).

A categorização da palavra como meio comunicativo da revelação é bem relevante para qualificação divina que, no Verbo e pelo Verbo (Palavra), acontece de modo gradual até chegar à plenitude (cf. Jo 1, 1-2). Pela palavra fala-se do divino que toma sua forma humana. Por ela, o que é divino se aproxima do humano e, em contrapartida, o humano se aproxima do divino. Ela integra e possibilita a interpretação do que está na mente de Deus e foi doado ao homem como símbolo do que é princípio, meio e fim da vida humana (cf. Jo 1,2-3). A leitura inteligente da Sagrada Escritura, tendo em vista os seus pressupostos teológicos, é sempre atual para o encontro e realização de todos os anseios da humanidade. Isto porque, nela, a mensagem divina é testificada como palavras (Decálogo) e Palavra (Logos. Idem, Jo 1,1), Jesus Cristo, o Verbo feito carne (cf. Jo 1,14), elemento interpretativo norteador da personificação da Palavra de Deus.

Por isso, a comunidade pode fazer a seguinte pergunta: a quem iremos Senhor, só tu tens palavras de vida eterna? (cf. Jo 6,68-69). Elas são de vida porque dizem ao homem o que ele mais deseja ouvir sobre si mesmo acerca do seu mistério, do seu fim, do seu ser, da sua existência, do seu tudo. Por ela, é dito que o Reino de Deus está próximo (cf. Mc 1,15). Por ela, se torna sempre presente que o amor pode ser vivido na história humana, apesar do seu pecado. Por ela, este Reino é de “verdade e de vida, reino de santidade e de graça, reino de justiça, de amor e de paz. Sobre a terra, o reino já está misteriosamente presente. Quando o Senhor vier, atingirá a perfeição (cf. GS 39)”. Quando se fala sobre esse mistério, deve ser lembrado que, hoje, este Reino acontece quando os Discípulos de Jesus, seguindo o exemplo do Mestre, tomam atitudes dignas de verdadeiros anunciadores da palavra que leram e ouviram. Estes “escritos mostram que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, para que, crendo, tenhais vida em seu nome (cf. Jo 20,31)”. Desta forma, é necessário que a Bíblia seja lida com o mesmo espírito com o qual foi escrita.

Na condição de discípulos e missionários de Cristo, faz-se importante que, em nossas comunidades cristãs, seja fomentada, em todas as pessoas, uma séria e profunda espiritualidade bíblica. A Igreja reitera este convite a todos os cristãos. Caríssimos, vamos ler a Sagrada Escritura! Pois, “Ignorar as Sagradas Escrituras é ignorar o próprio Cristo”, disse São Jerônimo (Séc. IV). A Igreja acredita na importância da utilização da catequese bíblica em sua ação missionária (cf. DV,VI). Esta palavra deve ser o fundamento de todo anúncio. Por isso, que seja lida e amada a Palavra de Deus.

domingo, 12 de agosto de 2007

Pais de Família, parabéns!

A Igreja de Cristo tem uma identidade. Inserida na humanidade como canal integrador da transcendência humana, ela tem a resposta para o que todos os homens mais desejam: “a felicidade”. O que é trivial ao que é sentido nas relações e anseios da humanidade é que falta a interpretação coerente e justa da mensagem cristã anunciada pela Igreja. Não se entende o anúncio do Mistério, pois amor é mistério, sem abrir-se à dinâmica da verdade do amor que impulsiona o homem ao que ele mais espera.

A Tradição da Igreja, personificada pelos Apóstolos e seus sucessores, cujo sinal visível de unidade e universalidade é conferido a Pedro (Cf. Mt 16,16-19) e que bem recentemente foi visualizado na V Conferência de Aparecida com a presença do Papa, reunido com os demais bispos, que radicada no dado revelado prestigia a família como comunidade de amor e de íntima comunhão entre homem e mulher e que deve continuar sendo pérola digna de zelo por toda comunidade cristã que, convertida ao que lhe salva, busca no paradigma cristológico com o qual Cristo amou a sua Igreja e por Ela se entregou (Cf. Ef. 5, 25), o espírito elementar da família cristã.

Pela história é perceptível que a luta pela manutenção duma forma para a relação entre homem e mulher, pelo vínculo do casamento, é dinâmico. Na antigüidade o filósofo grego Aristóteles no texto ‘A Política’, escrito no século III, depois de viajar e comparar 158 constituições, no seu livro III, diz que o fim da família é “uma associação estabelecida pela natureza, constituída entre homem e mulher, para atender às necessidades do dia-a-dia do homem, formada pelos que vivem da mesma provisão ou partilham o sustento”. O historiador francês Fustel de Coulanges (1830-1889), no clássico ‘A Cidade Antiga’, livro I, afirma que “o que unia os membros da família antiga era algo mais poderoso que o nascimento, o sentimento ou a força física: esse poder se encontra na religião do lar e dos antepassados. A religião fez com que a família formasse um só corpo nesta e na outra vida. A família antiga seria, pois, uma associação religiosa, mais que associação natural”. Ambas se diferenciam por terem acepções unilaterais, uma natural e outra sobrenatural, diferenciando-se, deste modo, da conotação cristã, que abarca as duas.

Hoje, comemorando o “Dia dos Pais”, a Igreja vem dizer que esta comunidade tem o seu legado no Mistério do Deus que é “Pai Nosso”. Não se pré-conceitua, como se ver, a história. Apenas é missão da Igreja apresentar e dar a sua visão universal daquilo que por ela é considerado tanto imanente como transcendentalmente, sem condicionar nenhum dos aspectos como comumente é sublinhado. No Catolicismo Católico está transcrito o que significa, para Igreja, esta união pelo sacramento do Matrimônio e, conseqüentemente, a família: “A aliança matrimonial, pela qual o homem e a mulher constituem entre si uma comunhão da vida toda, é ordenada por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, e foi elevada, entre os batizados, à dignidade de sacramento, por Cristo Senhor” (Cf. CIC 1601).

Para este dia, caríssimos Pais, a Igreja vos pede que, com amor, juntamente em comunhão com vossas esposas e filhos, cuidem um do outro nesta vossa unidade familiar que é chamada a ser sinal do amor com o qual Cristo amou a sua Igreja (Cf. Ef. 5,25-28) pelo testemunho de fé, pela fidelidade conjugal, pela paternidade responsável, pelo diálogo, pelo cuidado, pela responsabilidade, pela mansidão, pelos conselhos etc. e assim serão dignos que tenham um “feliz dia”, porque são queridos e amados pais de família. Por isso, parabéns, obrigado por existirem e que Deus vos abençoe!

domingo, 24 de junho de 2007

Bioética: questão antropológica

Atualmente é trivial ouvir-se comentários, debates, conferências, palestras, teleconferências sobre temas concernentes ao argumento no que diz respeito aos atos que influenciam direta ou indiretamente à vida humana e tudo aquilo que salvaguarda o seu pleno desenvolvimento. O significado da vida passa pelo que é natural à própria existência humana. Sobrepondo-se aos outros seres, o homem não só é reconhecido como ser vivente porque se movimenta; mas porque é consciente de ser o que é. Isso o faz nortear-se sempre para um fim. Ele age tendo em vista não só o imediatamente reconhecido. Ele espiritualiza a ação. Subordina o acaso com vista não só ao presente; mas ao futuro. Qualifica o ato porque é potencialmente estruturado para que o único possa ser tão importante quanto o todo. Como é consciente não anula a liberdade para não ser anulado por ela. Reconhece o diferente para adequar o caos. O homem, deste modo, desde a sua concepção é intrinsecamente vitalizado para ser o que deve ser; agir como deve agir; viver como deve viver; sentir porque deve sentir; amar porque é maravilhoso amar; reproduzir-se para completar e ser completado; pensar para descobrir-se e ser descoberto como realidade que existe para ser; mas também é ser para existir.

A filosofia realista clássica, com Aristóteles, Boécio e Santo Tomás, apresentou o conceito de homem de modo unidual; ou seja, ele é pensado como um ser individual de natureza racional. Passando por este último autor, a filosofia cristã acolhe a idéia e com ela embasa racionalmente a sua visão integral do homem dizendo que este é constituído de Corpo e Alma (Cf. Gaudium et spes 14). Desta definição tomamos duas acentuações relevantes: 1) O homem como ser corpóreo tem sua individualidade definida, se socializa, está no mundo, assume um espaço; 2) Como ser animado racionalmente tem sua subjetividade, transcende o imediato, está no tempo. Os dois pólos não se contrapõem; mas, ao contrário, se complementam e mostram que desde a sua concepção o homem tem dignidade emblemática em sua personalidade que deve ser respeitada e digna de direitos próprios de cada ser humano.

O Papa João Paulo II, de saudosa memória, citando o Concílio Vaticano II deplorou fortemente os múltiplos crimes e atentados que vilipendiam este ser humano. Diz ele: “À distância de trinta anos e fazendo minhas as palavras da Assembléia Conciliar, uma vez mais e com idêntica força os deploro em nome da Igreja inteira, com a certeza de interpretar o sentimento autêntico de toda reta consciência: ‘Tudo quanto se opõe à vida, como seja toda espécie de homicídio, genocídio, aborto, eutanásia e suicídio voluntário; tudo o que viola a integridade da pessoa humana, como as mutilações, os tormentos corporais e mentais e as tentativas para violentar as próprias consciências; tudo quanto ofende a dignidade da pessoa humana, como as condições de vida infra-humanas, as prisões arbitrárias, as deportações, a escravidão, a prostituição, o comércio de mulheres e jovens; e também as condições degradantes de trabalho, em que os operários são tratados como meros instrumentos de lucro e não como pessoas livres e responsáveis. Todas estas coisas e outras semelhantes são infamantes; ao mesmo tempo que corrompem a civilização humana, desonram mais aqueles que assim procedem, do que os que padecem injustamente; e ofendem gravemente a honra devida ao Criador’ (Cf. Encíclica Evangelium vitae, 3)”.

Ligado a estas intempéries é atual a questão da relação do ser humano com o ambiente. O tema da Ética Planetária ou Ambiental também já começa a ser discutido como elemento que inflige a relação do homem com os outros seres e com a sua própria qualidade de vida. Por isso, o debate no tocante à vida já se torna preocupante porque os fundamentos para uma respeitosa convivência do homem com o meio ambiente passa, necessariamente, por uma solidária integração do homem com os outros homens. Convertidos ao amor, os homens encontrarão o sentido para tudo o que fazem e descobrirão que é através do seguimento de Jesus Cristo que todos os povos terão vida, porque Ele é a Vida (Jo, 14,6).